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O visitante

 Depois do entardecer veio a escuridão e junto com a escuridão o medo.

O medo era uma constante para as famílias que moravam naquela área rural do interior do Paraná. Dizia a lenda que em noite de lua cheia, o lobisomem gostava de atacar os incautos e desprevenidos.

Naquela região, entretanto, a fera aparecia em qualquer noite, com ou sem lua, e fazia suas vítimas aleatoriamente, mesmo estando essas bem guardadas em suas casas. A sanha de sangue do ser maligno era insaciável.

A casinha do sítio era uma tapera sem água encanada e sem luz elétrica. Suas paredes escurecidas e apodrecidas pela intempérie ao longo dos anos, jamais receberam um pingo de tinta. Parecia que a qualquer momento podia desabar sobre aquela humilde família.

Moravam ali seu Osvaldo, Marcelina, sua esposa, e os três filhos do casal, Tiago de doze anos, Margarida de nove e o pequeno Maurício de três anos, que se encontrava febril, precisando com urgência de cuidados médicos.

— Devíamos ter ido à cidade e levado o menino ao posto de saúde à tarde — disse dona Marcelina angustiada, sentada em um banco de tábua, enquanto embalava o filho que choramingava, como se esse gesto pudesse aliviar a dor que a criança sentia.

Cabisbaixo, seu Osvaldo, sentado num toco serrado ao lado do fogão a lenha, tomava uma cuia de chimarrão, pensativo. Precisava sair em busca de algum vizinho que tivesse carro e também disponibilidade para os levar ao médico. Mas tinha medo. Quem não teria medo do perigo que rondava a todos?

— Nenhum vizinho sairá de casa nessa noite para acudir ninguém — comentou seu Osvaldo secando a cuia com duas puxadas finais que produziram um som oco e seco. — Nem que seja um caso de vida ou morte.

— E vamos deixar o menino morrer à míngua? — inquiriu Marcelina se levantando do banco. — Se você não vai buscar ajuda, então eu mesmo vou.

— Deixa de ser besta, “muié”. — Irritado, seu Osvaldo se levantou, colocou a cuia sobre a mesa. — Deixa que eu vou.

Sentados no chão semiescuro, pois apenas uma lamparina a querosene iluminava o ambiente, as duas crianças maiores, inquietas, viram o pai pegar uma cartucheira velha e enferrujada na parede, abrir a porta e sair para a escuridão.

Margarida correu trancar a porta e foi abraçar a mãe com lágrimas nos olhos.

— E se ele for morto, mãe?

— Não será, filha. Deus enviará proteção a ele. — Diante de tais circunstância a única opção era a oração e confiar em forças protetoras

De repente, um uivo horrendo se fez ouvir na quietude da noite, bem próximo da casa.

O menino Tiago que ainda estava sentado no assoalho, levantou-se tremendo de medo e correu pegar um facão velho, sem cabo, que havia sido guardado, enfiado na matajunta da parede.

Mais um uivo e um grito de pavor de seu Osvaldo foi ouvido por todos na pequena moradia. O pavor impregnado nele parecia se distanciar. Será que seu Osvaldo corria por sua vida?

Pela fresta da janela de tábua, os familiares viram uma luz azulada riscar na escuridão por três vezes seguidas. Seguiu-se ainda um tropel de luta corporal e mais uivo de dor e raiva desprendido por uma garganta poderosa. Brilhou mais uma vez a luz azul e tudo se aquietou.

Silêncio.

O que teria acontecido? Teria seu Osvaldo perecido diante a ameaça que os rondava a semanas? A coisa ia atacá-los também?

Inesperadamente a porta se abriu com um tranco e apareceu um vulto. Todos gritaram apavorados. Tiago derrubou o facão no chão e correu por trás de sua mãe que tremeu e quase derrubou a caçula.

— Tudo bem, gente, sou eu — disse Osvaldo entrando na casa, esbaforido, acompanhado de uma visita improvável.

O homem usava um traje verde com detalhes em branco e duas armas de pulso e tinha o rosto encoberto por uma máscara.

— Quem é…  esse… sujeito? — perguntou Marcelina com olhos escancarados. O medo dominando sua voz que tremia sem domínio.

 — Ele me salvou, Marcelina — disse Osvaldo emocionado.  — O monstro alienígena que dominava a região, que matou mais de dez pessoas e dezenas de animais, já não existe mais. Está morto em nosso quintal. — Sem conseguir se conter seu Osvaldo chorou. — Não fosse esse Homem Anônimo eu estaria morto.

Osvaldo secou as lágrimas e pegou o pequeno Maurício do colo da mãe.

— Ele vai me dar uma carona até à cidade — disse Osvaldo mais calmo. — Ainda bem que ele ouviu falar da criatura que rondava os sitiantes e estava à espreita. O monstro é imenso. Nunca vi nada tão grande. Tão medonho. — Osvaldo ergueu as mãos acima de sua cabeça para demostrar o tamanho da criatura.

Pouco depois uma pequena nave alçou voo daquela propriedade pobre e tomou o rumo da cidade. Aquela humilde família não sabia quem era aquele homem com traje de super-herói que os salvara.

Mas ainda ouviriam falar dele.

Era o: HOMEM ANÔNIMO

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